Primeira infância é janela de oportunidade preciosa demais para ser desperdiçada

Situação de pobreza pode colocar em risco o desenvolvimento de habilidades de crianças

Desde que o termo capital humano se popularizou, em meados da década de 1960, diversos estudos vêm confirmando a importância das habilidades e competências que as pessoas adquirem ao longo da vida para o crescimento econômico. No exemplo clássico, salários são tanto maiores quanto maior a escolaridade. Capacitações socioemocionais (como confiança e disciplina) também auferem retornos.

Hoje, sabe-se que a primeira infância, que vai do nascimento até os cinco anos, é um período crítico para o desenvolvimento destas habilidades produtivas. Como em qualquer decisão de investimento, há um tempo ótimo para fazê-lo.

Adversidades nos primeiros anos de vida –exposição à pobreza e à violência, insegurança alimentar, abandono e negligência, ou mesmo ambientes que oferecem poucos estímulos e desafios, muitas vezes decorrentes de um baixo nível educacional dos pais– são responsáveis por menores chances de sucesso profissional e por uma pior qualidade de vida muitos anos à frente. Mas apenas com os avanços recentes na neurociência foi possível compreender os mecanismos através dos quais o desenvolvimento cognitivo, emocional e social das crianças nesta idade compromete toda a sequência de acumulação do capital humano.

Os cientistas também descobriram que as diversas experiências que as crianças vivenciam em seus primeiros anos também são capazes de interagir com os genes e programá-los de forma tanto positiva quanto negativa. Um ambiente dinâmico, que oferece suporte e encorajamento às crianças nos seus momentos mais difíceis, facilita a experiência de aprendizagem, enquanto que a negligência e a falta de estímulos geram baixa capacidade de adaptação ao inesperado.

Os resultados apontados pela neurociência têm implicações para as políticas públicas que buscam fomentar a mobilidade social e reduzir desigualdades. Afinal, bebês são muito mais do que uma carga de genes, e o potencial de desenvolvimento de todos os seres humanos encontra-se na combinação da genética com a qualidade das relações que desenvolvem e do ambiente no qual se inserem nos primeiros anos de vida.

No Brasil, cerca de 40% das crianças de 0 a 5 anos ainda vivem em situação de pobreza, acima da média de 25% que incide na população, um percentual que variou muito pouco na última década. Para elas, políticas de transferência de renda, ainda que condicionais a serviços de educação e saúde, vêm se mostrando insuficientes. Alternativamente, diversas experiências em programas de visitação –que ensinam e delegam aos cuidadores diversas opções de jogos e estratégias de comunicação que podem ser introduzidas no cotidiano da família– apresentam resultados mais promissores. Melhor, estas intervenções envolvem poucos recursos monetários e quase nenhum investimento de tempo adicional por parte dos cuidadores, que apenas mudam a forma como se relacionam com a criança.

Nas palavras de James Heckman, prêmio Nobel em Economia e grande estudioso do tema, o amor que depositamos nas crianças também faz parte da equação econômica. A primeira infância é janela de oportunidade preciosa demais para ser desperdiçada. É um tempo que não volta mais.

Fonte: folha.uol.com.br

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